[Crítica] Entrevista com o Vampiro: Livro + Filme (1994) + Série (2022)

Em 1976 é lançado o livro de estreia de uma das escritoras mais conhecidas no gênero literário de horror - Anne Rice. Na junção vitoriana do romance em meio aos horrores existenciais, ela inicia assim uma saga que nos seduz pelo desenvolvimento de seus personagens mitológicos, nos aproximando deles através do que ainda é humano.

"Entrevista com o Vampiro" é o primeiro livro do que ficou conhecido como as "Crônicas Vampirescas" e gira em torno de três personagens centrais: Louis de Pointe du Lac, Lestat e posteriormente, Cláudia. O que achei bem estranho (e que até atrapalhou um pouco minha leitura), foi o fato do livro não ser dividido em capítulos. São apenas 4 partes em suas pouco mais de 300 páginas, algo meio fora do comum. 

Anne Rice inicia muito bem e nos faz cair de cabeça na história de Louis, seu encontro com Lestat e o que isso acabou acarretando ao longo de praticamente TODO o livro: sua crise existencial. A "Primeira Parte" (que vai até sua metade: página 150 mais ou menos) é o que contém o que Anne Rice tinha de melhor a nos oferecer. A "Segunda Parte" é praticamente descartável, uma "encheção de linguiça" totalmente desconexa da história central. Depois, a transição de cenário para a Europa, voltando a ter um propósito com o "Teatro dos Vampiros" e que até possui pontos interessantes, mas não com a mesma força inicial e que acaba por cair no enfadonho. Os momentos com Armand beiram o tédio.

De sua metade para o fim, vemos a escritora se estendendo em prolixidade pra conseguir chegar numa reviravolta final (onde tenho quase certeza que MUITA gente adivinhou o que aconteceria) e que infelizmente, sua obviedade junto do meu grande esforço pra conseguir ler até o fim, me fizeram desistir de continuar com os outros livros da saga. Talvez em "O Vampiro Lestat" e em "A Rainha dos Condenados" a autora melhorou esse problema da verborragia, mas sinceramente, vou preferir não me arriscar.

O que não foi difícil de perceber foi a inspiração da autora Stephenie Meyer (da saga Crepúsculo), principalmente em Louis, para a criação de sua versão do "vampiro romântico e bonzinho" - Edward Cullen. Ambos brilham e estão na mesma crise existencial entre aceitar sua natureza de vampiro assassino ou continuar dentro dos preceitos religiosos do que se difere o bem do mal. Mesmo que abordado de formas diferentes, as referências estão ali, bem claras.

A problemática adaptação de 1994 

Anne Rice ficou #chateada quando viu que Tom Cruise interpretaria o seu Lestat. Não bastasse as polêmicas de bastidores e os problemas de escalação no elenco, o filme (que até hoje é considerado um clássico por muitos) acabou não conseguindo se safar de ser uma má adaptação. Dirigido por Neil Jordan e com um roteiro escrito pela própria Rice, "Entrevista com o Vampiro" não consegue expressar sua própria essência e nos entrega algo "enlatado". Mesmo sendo um filme bem fiel aos principais atos, ele peca em suas principais reflexões, escolhendo andar por caminhos tímidos.

Indicado ao Oscar por melhor direção de arte e melhor trilha sonora, e com Kirsten Dunst sendo indicada como melhor atriz coadjuvante no Globo de Ouro por seu papel mirim, vemos nesses quesitos o que realmente o filme tem de melhor. De pior, entendemos o porquê o figurino não recebeu indicações, e não bastasse a caracterização cafona dos vampiros, vemos um Brad Pitt totalmente desconfortável como Louis. A sensação que tive ao vê-lo em cena foi de um ator que não estava feliz em sua profissão. Como se ele estivesse ali sendo obrigado. Tom Cruise, depois de todo desacordo de Anne Rice com sua escalação, se esforça ao máximo e faz a mulher até mudar de ideia e se redimir por toda sua desaprovação antecipada. Mas quem rouba a cena mesmo é Kirsten Dunst como Cláudia.

Após suas 2 horas de duração e apesar de seus pontos fortes, o restante que vemos é de algo "engessado", principalmente para quem havia lido o livro antes de assistir o filme. Talvez esse resultado tenha sido pela produção ter passado boa parte de seu tempo pisando em ovos tentando agradar a todos.
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★★ (Regular | Nota: 5/10)

O sangue fresco demais da série 

Entre erros e acertos, mais uma vez. Em 2022 é lançado a série pela AMC como um revival para os fãs. Criada por Rolin Jones, a 1ª temporada possui 7 episódios muito bem produzidos, e se no filme de 1994 houve tantos problemas com a escalação de elenco, acredito que aqui, não houve. Jacob Anderson como Louis, Sam Reid como Lestat e Bailey Bass como Cláudia dão um show à parte. 

A série traz alguns pontos importantes do livro que não estão no filme de 1994, mas por outro lado acaba também exagerando e cometendo grandes deslizes. Se no filme a sexualidade entre Louis e Lestat é algo implícito, na série já vemos um casal homossexual com seu relacionamento aberto. A ideia é até bacana e se encaixaria perfeitamente, mas parece que acabam esquecendo completamente da mitologia criada acerca desses personagens. Eles são vampiros, não mais humanos. Os vampiros que eu saiba (ou pelo menos o que pareceu no livro de Anne Rice) tem uma espécie de erotismo "fluído" entre eles. E homoafetividade/sexualidade é algo humano. Mesmo havendo essa linha tênue de crise vampiro x humanidade no personagem de Louis, acho que confundiram bastante toda essa questão e enfiaram os pés pelas mãos.

Outro problema ao meu ver foi o motivo esdrúxulo que a série encontrou de fazer o jornalista regravar toda a entrevista com o Louis (depois de anos) para ouvirmos praticamente a mesma história. Não havia necessidade alguma de vincular a série com as fitas cassetes dos anos 90, isso acabou gerando furos na história e não se sustentou. Era só readaptar tudo novamente e pronto, sem esse salto temporal que acabou indo parar em Dubai. 

Em 1994 a gente até engoliu, mas em 2022 um vampiro andar normalmente no meio de humanos com "lentes de contato de vampiro" é algo bem estranho. Principalmente quando o roteiro não coloca ninguém para notar que os olhos do Louis ficaram diferentes repentinamente depois que ele começou a andar com Lestat.


Apesar dos pesares, é uma série que tem seus momentos e foi feita já pensando numa 2ª temporada. Com seus 7 episódios contando apenas a primeira metade do livro, na próxima (se seguirmos a lógica) provavelmente irão abordar os momentos da transição de cenário entre Nova Orleans e a Europa, sendo assim, a última temporada caso "Entrevista com o Vampiro" seja o único livro da autora que eles queiram adaptar.
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1ª temporada: ★★ (Regular | Nota: 5/10)

*Visto em áudio original: inglês | Legenda: PT-BR