[Crítica] Batem à Porta: Menos na dos ateus e agnósticos


O meu ponto de vista é de quem não leu o livro "O Chalé no Fim do Mundo" de Paul G. Tremblay pra analisar o roteiro como adaptado. Então, vou falar o que achei apenas olhando o apresentado pelas mãos do Shyamalan e dos corroteiristas Steve Desmond e Michael Sherman.

Aqui temos o "diretor dos plot twists" num modo mais convencional, sem preocupação alguma em imprimir tanto suspense e sem o seu já tão conhecido "selo" de reviravoltas e tramas excêntricas, algo que já lhe é peculiar, mas que talvez esteja se tornando até um fardo de se carregar. Mesmo que Shyamalan deva saber muito bem quem ele é como cineasta e não seja obrigado a nada, o fez ter essa autoestima e liberdade de preferir apenas contar uma história forte e da forma mais simplista possível. Isso não quer dizer que não tenha sido eficaz no que apresentou, mesmo que de uma forma diferente.

"Batem à Porta" antes de tudo é uma história de amor. E especificamente nesse quesito as coisas não são tão simples assim. Afinal, temos aqui o amor altruísta batendo na porta da cabana onde o amor egoísta está, tentando convencê-lo a se sacrificar por um "bem maior". É um filme que chega a emocionar, mesmo que seu lado aterrador esteja também ao seu lado.

O foco não está tanto em gerar aflição ou tensão, mas uma característica do diretor que não foi deixada de lado foi o desenvolvimento e sustentação da trama basicamente em cima de seus personagens. Assim como o visto em "Vidro", boa parte da tensão na história é carregada através das atuações e diálogos. 

E olha, TODO o elenco consegue entregar sem escrúpulos o necessário para elevar o filme nesse fator. Não à toa, a direção não cansa de usar enquadramentos com um zoom no rosto dos atores em boa parte de seus momentos de tensão (principalmente no casal protagonista - interpretado por Jonathan Groff e Ben Aldridge - e no personagem de Dave Bautista).

Rupert Grint em cena conflituosa de "Batem à Porta"

Como no gênero suspense não necessariamente usa-se jump scares, é assim que "Batem à Porta" consegue sustentar sua trama interessante do começo ao fim: com um roteiro polido, boas atuações e uma direção que conduz e "coreografa" muito bem cada movimento. Não sei dizer se a intenção do filme foi deixar o espectador APAVORADO com todo esse caos do "fim do mundo", mas talvez tenha sido só uma coincidência ele ter sido lançado dia 02 de fevereiro de 2023 e 4 dias depois um terremoto ter assolado a Turquia (e regiões) de forma tão devastadora.

Sobre essa linha tênue entre ficção e realidade que está toda a apreensão e é assim que esse filme também se torna assertivo: na sensibilidade de trazer problemas climáticos e de desastres naturais do âmbito literal pro âmbito metafórico. O fato de um "Apocalipse" estar ligado à religião também entra nessa equação da metáfora, e mesmo o roteiro sendo claro e explícito em propagar a mensagem de que devemos acreditar em "algo maior" (momento em que muitos ateus talvez torçam o nariz), ele também segue por esse lado totalmente impessoal e amplia a possibilidade de entendermos a mensagem de forma não literal. Se a religião existe aqui, ela está apenas em simbolismos.

O uso de flashbacks para aprofundar a história de seus protagonistas foi outro acerto que enriqueceu e favoreceu muito o ritmo e edição. E mesmo a invasão domiciliar sendo algo já clichê pro gênero, aqui nem tem como dizer que não houve originalidade devido sua genial subversão, fugindo totalmente do que seria uma possível ameaça e usando até de um certo cinismo para nos apresentar a gravidade do real problema.


Mesmo que a força de sua história esteja na reflexão atrelada a um significado do amor e de suas escolhas e sacrifícios, ele não deixa de possuir um conteúdo bem simples, objetivo e redondinho. Talvez porque a intenção tenha sido realmente essa: a interposição entre o simples e o difícil. E confesso que fiquei com vontade de ler o livro.
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★★★ (Muito bom | Nota: 7/10)

*Visto em áudio original: Inglês | Legenda: PT-BR