[Crítica] Herege: Hugh Grant numa teologia diferente


Antes de qualquer coisa, mais uma vez temos a necessidade de falar sobre o equívoco na classificação do gênero. Não sei por que o pessoal do marketing acredita que o espectador perderá o interesse se o filme for divulgado dentro do que ele realmente é: SUSPENSE. Outra questão (que não é de hoje) é sobre a classificação indicativa, que eles colocam algo sem tanta justificativa para tentar chamar atenção do público por uma violência extrema que nem sempre está lá. No Brasil, “Herege” (2024) recebeu +16, quando seu conteúdo, mesmo que intrigante, poderia tranquilamente ser +14. 


Dirigido e escrito pela dupla Scott Beck e Bryan Woods, que já possuem uma boa relevância no gênero, conhecidos pelo roteiro do primeiro "Um Lugar Silencioso" (2018) e pela direção e roteiro do ótimo e surpreendente "Haunt" (2019), aqui eles também assumem a cadeira de direção e roteiro, sem parecer precisar se escorar em ninguém para desenvolver suas ideias. 


“Herege” (2024) se equilibra em três pontos: direção, roteiro e atuações. Mesmo que sua força maior esteja no roteiro afiado, inteligente e sensível. Não acompanhei a carreira de Hugh Grant para ter um parâmetro, mas sua performance aqui está arrebatadora, contida e misteriosa. Porém, o que me chamou atenção mesmo foram as expressões faciais das jovens Sophie Thatcher ("Yellowjackets") e Chloe East ("O Lobo de Snow Hollow"), que em boa parte do filme carregam a sensação de perigo apenas com o olhar, numa história que exemplifica o que seria um suspense cadenciado.

O que para muitos pode ter sido uma decepção, para outros foi uma interessante aula de teologia, onde dois contrapontos de crença e descrença se equilibram, mesmo que sua proposta seja chegar no mesmo lugar, independente de qual lado você esteja. Os diálogos intrigantes acabam prendendo nossa atenção do início ao fim, além de criarmos empatia pelas personagens "ovelhas de Jesus", nos fazendo torcer por elas. 

Diferente do recente “terror religioso” – "Nefarious" (2023) – aqui a ladainha não soa gratuita e o mistério entra numa crescente justamente por gerar mais dúvidas do que esclarecer seus questionamentos de forma doutrinária. 

O roteiro faz uma subversão do que seria a construção de algo complexo, e se desconstrói. Sendo concluído de forma simples algo que, em contrapartida, havia se iniciado complexo. Isso para mim soou mais como uma metáfora dentro de todo seu contexto, do que um ponto negativo. "Herege" (2024) não chega a uma intensidade maior, mas é um filme que vale o ingresso. Mesmo que depois de tudo ele acabe não fazendo parte de nenhum cânone, seja ele qual for.
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★★★ (Muito bom | Nota: 7/10)

*Visto em áudio original: Inglês | Legenda: PT-BR